19.11.23

Protesto

Só num cemitério de Mariupol estão mais de sete mil campos numeradas de ucranianos massacrados pela forças russas. Apenas numa cidade, num só cemitério. Quantas mais cidades, quantos mais cemitérios, quantos mais desaparecidos, que nunca serão enterrados. E, no entanto, para muitos dos que agora justamente protestam contra o genocídio exercido pelas forças fascistas de Netanyahu sobre Gaza, este é tema tabu. Nunca lhes ouvi uma palavra que não fosse de apoio ao agressor russo, uma subserviência pegajosa a Putin. Mas a definição de genocídio não depende da origem geográfica do executado. Um bebé ucraniano tem tanto direito a ter um futuro, uma terra onde crescer em segurança, quanto um palestiniano. A maior guerra que continuamos a ter frente a nós, sempre foi, sempre será, contra essa forma sociopata de atirar areia para os olhos dos outros, a que chamamos hipocrisia.

7 comentários:

  1. Há muito tempo que eu aguardava por um post assim. Interrogava-me: 'Será que o mundo pode ruir à sua volta que ele não vai dizer uma palavra?'. Sabia que, quando escrevesse, seria de antologia. Confirmou-se. Gostei de ler.

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    1. Há um livro de que gosto muito e de que a UJM gostaria, tenho a certeza. É de um filósofo (falecido há pouco) chamado Harry Frankfurt, e tem o título de «On Bullshit». Quando vejo manifestações a favor da paz, mas que são apenas a favor da paz num dos lados do mundo, penso sempre nas palavras de Frankfurt: «One of the most salient features of our culture is that there is so much bullshit.» Creio que não devemos ter medo de o dizer, de chamar os bois (e os boys) pelos nomes: «Bullshit». Não querem a paz, querem tudo menos a paz. Creio ser a guerra mais relevante do nosso tempo: a guerra contra a areia nos olhos. Todas as outras se tornarão transparentes, depois de vencermos esta. Obrigado UJM.

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  2. Nas guerras de interesses, as pessoas valem muito pouco. São efeitos colaterais. São trocos nas consciências de narcisistas com poder a mais e empatia a menos.
    Bom dia, sô Xilre

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    1. Em cada 22 pessoas, uma é psicopata. É nestas alturas que percebemos quão verdadeira é esta estatística, nn. Uma tarde bonita para si.

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  3. Rousseau acreditava na natureza humana -- creio que a principal lição é que o problema é esta e não a sociedade, que é fruto da dita natureza. Como digo acima, a principal guerra a travar é contra a hipocrisia, a areia nos olhos. Vencida esta, não que se vençam todas as outras -- vencida esta, muitas, a maioria, das outras, nem chegarão a começar.

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  4. Vencer a hipocrisia é trabalho de cada um em si mesmo, ou a mim me faltam recursos mentais para ver outros caminhos. Não sei se "dar a outra face" é caminho navegável, o sentido da afirmação não é, como sabemos, o mesmo que nos ensinaram e me pareceu sempre um exagero. O exemplo é bom método mas, na classe política, está em desuso; na educação (família, escolas, sociedade em geral e media em particular), não abunda. Contando com a herança genética, fica um caldo pouco digestivo. Depois, o mundo está povoado de avestruzes, eu incluída.
    Bom dia

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  5. "Rousseau acreditava na natureza humana". Já Simone de Beauvoir acreditava exatamente no contrário: "A verdadeira natureza humana é não ter natureza nenhuma. Aquilo que somos, não é o simples cumprir de um destino, programado nos cromossomas, mas a realização de um ser que se constrói em troca com os outros e com a realidade envolvente."
    Vai-se a ver e o Marx é que tinha razão: “Os filósofos limitaram-se a interpretar o mundo de modos diferentes; o que importa, porém, é transformá-lo.”
    Ao que parece andamos em círculos, de transformação em transformação e sempre regressamos ao homem-lobo iniciático.



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