9.6.23

Orgulho

Não foi preciso esperar por segunda. Durante o almoço de sexta, Prima Vaz envia WhatsApp com foto dela com Menina Gabriela ao colo. Menina dorme, com ar de tranquilidade absoluta. Já no olhar de Prima vislumbro o orgulho de Vasco da Gama, ao dobrar o Cabo, de Armstrong, ao alunar, de Alexandre, ao conquistar o mundo.

Menina Gabriela

Menino Ricardo já é Mano! Telefona-me Prima Vaz a dar nota do nascimento de Menina Gabriela, doravante conhecida também por Mana ou, ao menos, assim será, logo que Ricardo consiga assimilar a palavra e o novíssimo estatuto. A mãe de Menina está bem, o pai, igualmente, e Prima Vaz, mais efeverescente ainda do que o seu habitual. Temos café marcado segunda, e será certo que Prima trará notícias de Menina. E depois, que palavras poderá um fiel narrador, leitora, usar para descrever a mais linda recém-nascida do mundo?

4.6.23

Algumas palavras

— Não o conheço do Facebook? pergunta-me Mário de Carvalho, quando lhe digo o meu nome, para grafar no autógrafo.

Não, caro Mário, do Facebook não, que é paragem que não frequento. De onde, nunca viremos a saber. Mas eu admiro os seus escritos desde os meus longínquos dezassete anos, e muito feliz fico de juntar à memória dessas leituras a de finalmente trocar algumas palavras consigo, e ter um livro que esteve, na interação, por breves instantes, nas mãos de ambos.

2.6.23

Distâncias

O que eu gostaria de ter gostado de ler “Um cão no meio do caminho”, de Isabela Figueiredo. Os livros de que gostamos, esperamos que não acabem, ainda que as histórias que encerram sejam desconfortáveis. Mas ansiei terminar este, e o meu desconforto não se ficou a dever ao neo-neorealismo da história. Antes ao facto de a proximidade face a lugares e tempos — parte da história passa-se na atualidade, a sul e norte de Lisboa — funcionar como uma lupa que amplia lacunas narrativas e (pequenas) incongruências. Talvez eu precisasse de maior distância face à história, para a achar verosimilhante. Ou de maior distância face à História. Ou talvez seja essa a conclusão a tirar de um livro sobre distâncias: a distância precisa de distância para ser entendida.

30.5.23

todos os cinco

a uma memória tatuada nos sentidos

chamamos saudade

[alfredo serras]

26.5.23

clepsidra

um beijo por dar

também tem memória 

[alfredo serras]

21.5.23

Condição

Quando o poeta perguntou se ainda podia dizer um soneto para encerrar a sessão, a moderadora, filóloga, assentiu condicionalmente: 
— Sim, se não for muito grande.

20.5.23

Quites

O poeta basco achou-me parecido com o escritor italiano. Eu, em contrapartida, achei-o parecido com o pintor português. Assim, os dois, entre três nacionalidades, nos entendemos, assim ficámos quites.

19.5.23

Espanto

Sempre que chego ao café, é Carolina Deslandes que canta no rádio que proporciona a banda sonora. Nunca ela saberá quão grato lhe estou por tal coincidência, pelo espanto que me causa e me escuda por instantes das conversas nas mesas ao lado, que dissecam sílaba a sílaba, as audições parlamentares do dia prévio. Por outras palavras, é o espanto que me protege do que já não me espanta.

14.5.23

Modernidade

Peço as componentes do pequeno-almoço, mas tenho de repetir por outra ordem, a determinada pelos menus do telefone inteligente de Senhor Chico, onde ele as seleciona uma a uma, pisco, no ecrã, com titubeante indicador, ao sol ofuscante da manhã na esplanada.