10.11.22

L’Amour La Mer




Lê-se «L’Amour La Mer» de Pascal Quignard como se segurássemos a câmara que se detém nos personagens, se alonga no fio das palavras que estes vão, parcimoniosamente, articulando, ou fazendo macro sobre os pormenores do cenário com precisão queirosiana. Quignard é o autor do guião, encenador e diretor de fotografia da prosa que desfila, com o requinte, erudição e humor que são marca em todas as suas obras, embora nesta, de modo mais fluído, talvez como o amor, talvez como o mar. Situando a ação no século XVII, Pascal Quignard percorre a criação de um tecido cultural de matriz inequivocamente europeia, com os seus músicos, pintores, artistas. Sempre trazendo para a linha da frente os obscuros, mudando a luz que ilumina os conhecidos, envolvendo o todo num véu de sensualidade, pois que é a cultura senão a celebração dos sentidos?

«L’Amour La Mer» não é livro banal ou fácil. Precisa ser vivido página a página, já que a poesia da prosa de Quignard não se deixa absorver de um só gole, como um copo de água. Antes degustado como um vinho velho. Mas como não gostar da imagética, melhor, da fotografia em palavras, deste catálogo de sentimentos tão perfeitamente expostos na sua impossível delicadeza, na travessia da língua francesa fundada sobre gerações de estilistas do verbo, de Proust a Éluard, neste mapa de ideias onde se cruzam os interesses de Quignard e também os nós de ligação com outras das suas obras anteriores? «L'Amour La Mer» é tanto um romance como um ensaio, uma odisseia sobre os pilares da criação de uma ideia de Europa, raiz tanto de pertenças como de perplexidades.

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