12.12.24
Ilusionismo labiríntico
Durante anos, tenho protelado a visita a um dos meus restaurantes favoritos, algures no coração de um labirinto em Lisboa, vítima da guerra inevitável entre a arte da gula e o desaguisado do estacionamento. «Não vale a pena», pensava eu, imaginando voltas eternas pelas ruas estreitas e um jantar arruinado pela ansiedade de encontrar o carro bloqueado. Hoje, noutro restaurante, longe dessas preocupações, ouço casualmente, vindo da mesa ao lado, onde falavam de restaurantes e onde surge também o nome do referido, inatingível como um oásis: «E tem estacionamento privativo, mais acima», como se o mérito da casa fosse mais logístico do que epicuriano. Fiquei a olhar para o vazio, imóvel, como se me tivessem retirado o prato a meio da garfada. Anos de renúncia, e afinal havia um refúgio eficaz para o carro. O verdadeiro mistério da gastronomia lisboeta não está em porque é que insistem em chamar «Joaquinzinhos» aos jaquinzinhos, mas nos estacionamentos escondidos à vista plena.
Olhe, quando quiser oferecer uma prenda aqui a esta fiel leitora, pode ser um guia destes seus roteiros gastronómicos, com sugestão de prato e indicação de estacionamento (tem que se actualizar). Se for muito bom, admito ir de transporte público, excepção a metro que odeio (por baixo da terra só depois). Leve o tempo que quiser que na reforma irei usufruir melhor:)
ResponderEliminarCara CC, o seu comentário inspira-me a pensar que talvez o verdadeiro guia de que Lisboa precisa não seja gastronómico, mas filosófico: uma arte de navegar entre pratos eternos e obstáculos urbanos. Prometo reflectir sobre isso enquanto descubro novos esconderijos para carros e segredos culinários. Quanto ao metro, compreendo — nem todos os caminhos passam por debaixo da superfície, mas prometo que, no meu futuro roteiro, todas as opções terão alternativa terrestre, mesmo que envolvam um elétrico com charme centenário.Afinal, a reforma pede tempo, e Lisboa nunca apressa os seus mistérios.
EliminarCom o advento da Uber e afins, isso deixou de ser um problema caro Xilre e com a vantagem de se poder beber um pouco mais...
ResponderEliminarCaro Joaquim, tem razão, a Uber tornou-se um antídoto elegante para os dramas do estacionamento, permitindo-nos focar no essencial — o jantar e o vinho. Ainda assim, confesso um certo apego ao percurso, às voltas labirínticas e até àquela vitória amarga de encontrar um lugar a mil metros do destino. É o tipo de desafio que Lisboa, caprichosa como é, insiste em oferecer. Com a Uber, é tudo tão eficiente que até a ansiedade do carro bloqueado desaparece — e, com ela, um pouco da narrativa épica que torna a noite memorável.
Eliminarpois aqui são charamanecos, não jaquinzinhos, nem joaquinzinhos :)
ResponderEliminarCharamanecos sejam então: mesmo não associados à época natalícia, são apetecíveis em qualquer dia e com qualquer designação. :)
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