Há uma figura social que se repete com a previsibilidade de uma maré; não é a de quem entra numa sala de forma discreta, mas antes a de quem anuncia a sua chegada com um refrão quase épico: «Eu sou muito frontal, digo sempre tudo o que penso». O tom é de um cruzado moral, como se a sinceridade bruta fosse uma virtude inquestionável, e não apenas um ato de impaciência verbal. Curiosamente, esta frontalidade raramente se aplica a uma autoanálise — há algo de fascinante no facto de estas pessoas nunca dizerem: «Sou tão frontal que às vezes sou um idiota». Não. A frontalidade, aqui, é uma via de sentido único.
Depois, há o acréscimo inevitável: «Comigo sabem sempre com o que contar». Como se a previsibilidade fosse um elogio. Imaginem se Tolstói tivesse seguido essa lógica e começado Anna Karenina com: «Todas as famílias felizes são iguais e é isso, não esperem mais nada». Seria um descalabro literário, mas aparentemente, na vida social, a ideia de ser uma personagem unidimensional é vendida como virtude. E o pior é que, em muitos casos, o conteúdo da tal frontalidade é uma coleção de banalidades mal-disfarçadas de coragem: «Aquela tua camisa parece-me da feira de Carcavelos», «Já fazias uma dietazinha, não?». Nada que algum silêncio bem colocado não resolva.
O que me intriga é esta certeza de que dizer tudo o que se pensa é sempre um bem maior. Afinal, quem disse que cada pensamento merece ser dito? Descartes afirmou: «Penso, logo existo» — não «Penso, logo manifesto opiniões desnecessárias». A vida, já saturada de ruído, não pede mais um comentário frontal sobre a chuva ou o trânsito. Pede a elegância de saber quando a frontalidade se torna mero exibicionismo e quando o silêncio, esse luxo subestimado, é a mais nobre das verdades.