2.1.25

Breve teoria sobre o frio alheio

Há um fenómeno curioso que ocorre quando se aterra numa terra emprestada onde o termómetro se afasta, desdenhoso, das temperaturas familiares. O frio dos outros é sempre mais pessoal, mais íntimo. Não se limita à pele ou aos ossos — infiltra-se na alma como uma carta sem remetente, carregada de intenções obscuras. Aquele vento cortante que eles ignoram com um encolher de ombros torna-se, para ti, uma entidade hostil, uma espécie de humorista sarcástico que te pergunta, a cada esquina, onde está o traje de esquimó que achaste opcional.

Os locais, por sua vez, encaram-te com a superioridade natural de quem já domesticou o clima. Para eles, o teu tremor visível e o gorro com o nome da terra, comprado à pressa na loja de artesanato local, são um ato de uma comédia discreta, uma prova de que os turistas não são de confiar nem quando se trata de proteger os próprios neurónios. Enquanto bebes um chá desenxabido que não convence nem o frio nem o espírito, percebes que há um código de sobrevivência que não vem em guias turísticos: aqui, o frio não se combate; negoceia-se. E tu, claramente, trouxeste pouca coisa para a mesa.

2 comentários:

  1. Bem observado caro Xilre, agora o que lhe digo é que lá fora ou aqui, é aguentar firme e hirto, não podemos deixar que ele ganhe este combate, lá fora não sei mas a modos como as urgências andam por cá...

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  2. Ignoro a maluquice que nos assola quando viajamos para países frios com roupa manifestamente incapaz. É claro que o clima e os autóctones se riem. Só gostava que me ensinassem como se protege o nariz.
    Estes dias em Portugal também puseram à prova o vestuário de inverno.

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